Quando você lê 2 de abril, dia da conscientização mundial do autismo, voce já parou pra pensar: conscientização de que exatamente?
Na minha opinião, o primeiro ponto a levar pra vocês como reflexão é a questão da epidemia de diagnósticos autistas que nos remetem à uma pergunta que não quer calar: o que existem são os milhares de diagnósticos autísticos ou realmente são os milhares de autistas?
Sim, porque existe uma diferença entre SER autista e RECEBER o diagnóstico de autista.
Até porque a forma de diagnóstico muda de profissional pra profissional.
Por exemplo, na psicanálise lacaniana, o foco no atendimento está na articulação do sujeito com a linguagem, ou seja, como o sujeito autista (e não o autista) se articula com a sua escrita, a sua linguagem…. o diagnóstico é feito na transferência entre o sujeito e o analista, é feito na clinica, de uma forma muito particular…. é preciso encontrar e conhecer COMO é o sujeito sem aquele rótulo preestabelecido, ou por um diagnóstico preexistente que os pais apresentam, ou até mesmo sem a contaminação dos nossos próprios pensamentos, achismos e hipóteses diagnósticas.
Nós, enquanto analistas, devemos nos despir de todas essas possíveis interferências para não contaminar aquilo que o sujeito na nossa frente está mostrando, seus desejos, seus medos, suas vontades, seus sonhos, frustrações e tudo mais, ou seja, uma das principais conscientizações é compreender que, antes do autismo rotulado que rouba toda uma possibilidade da pessoa de viver por si mesmo uma vida plena, está um sujeito que não é isso nem aquilo, ele simplesmente É, assim como você e eu.
Mas voltando à comparação de formas diferentes para chegar à um diagnóstico, psicólogos de outras abordagens, um psiquiatra ou até mesmo um neurologista podem chegar ao diagnostico do Espectro Autista levando em conta, por exemplo, o comportamento, mas nós não levamos em conta o comportamento, repito, levamos em conta a estruturação da linguagem, porque?
Porque o comportamento pode ser confundido. Uma criança pode ter comportamentos autisticos, mas se tratar apenas de uma criança com inibição, ou até uma criança psicótica. Só o comportamento não nos afirma nada.
Isso não quer dizer que um esteja certo e outro errado, são apenas formas diferentes de se chegar a um diagnóstico. Por isso, é fundamental o cuidado que os pais devem tomar quando estão buscando um para o seu filho, querendo que logo seja descoberto um nome que traga alívio, por finalmente terem descoberto o que seu filho tem…. é como se um diagnóstico deixasse as coisas mais fáceis…. já descobri o que é, agora é só seguir a cartilha e cuidar.
Porém esta “descoberta” que alivia também machuca e deprime, ou seja, um diagnóstico errado prejudica todo o sistema familiar.
A conscientização também deve partir dos profissionais em geral de como devem estar altamente capacitados para assumirem tamanha responsabilidade ao reduzir uma pessoa a um nome porque quando eu falo em diagnóstico, incluo sobretudo, todo um manejo clínico, múltiplas terapias e acompanhamentos profissionais que vão ser executados de maneira muito eficiente, porém focados no RÓTULO, no diagnóstico!
Lembram da criança que eu citei como exemplo que recebe o diagnostico de autista, mas na verdade ela pode ter inibição?
Pois é, a inibição é um sintoma da neurose e o manejo deverá ser feito para uma estrutura neurótica. Se eu acredito e assino embaixo que aquela criança é autista e planejo um manejo e ajudo a família a montar toda uma rede de apoio e tratamento para a estrutura autística, o manejo será totalmente diferente e os profissionais envolvidos farão a estimulação somente do que estiver dentro do quadro do tratamento para a estrutura errada e as outras habilidades da criança para sair da condição de inibição não será tratada.
Outra coisa muito pior, essa mesma criança poderá crescer e levar uma vida inteira achando que é autista, sendo que na verdade não é
É evidente que quando falamos em conscientização, tem muito mais questões envolvidas, tão importante quanto isso tudo que falei, principalmente relacionadas às questões de políticas públicas. Mas pra não me estender muito, procurei trazer esta reflexão, tanto para os pais quanto para profissionais que cuidam de pessoas com o trantorno.
Um abraço a todos vcs.
Deixe um comentário